Quinta-feira, 6:30 da manhã a tv ligou. Acordamos e eu tinha uma dor estranha nas costas. Ter dor nas costas faz parte do meu dia-a-dia. Vira e mexe eu durmo torta, fico torta na cadeira e claro, vem aquela dorzinha. Mas essa dor era diferente, era estranha. Eu e o Pedro falamos tchau para o Márcio e lá fomos nós para a escola. Lá pelas oito e pouco da manhã, além do incômodo nas costas, doía o lado direito do peito. Mandei um e-mail ao Márcio falando que algo estava estranho e que inclusive eu estava respirando “curto”. Ele achou que eu precisava ir ao pronto-socorro, poderia ser algo no coração. Dali um tempo, liguei pedindo para ele passar pra me encontrar para irmos até o hospital. Às 10:30 estávamos lá. Nesse momento eu sentia um incômodo nas costas, ao lado direito do peito, no meio do peito e a respiração estava péssima. O médico do pronto Socorro fez várias perguntas e me deixava tranqüila dizendo que parecia não ser nada, um stress talvêz, mas mesmo assim eu faria um exame de eletro e um raio x do tórax. Como assim stress, pensei, se eu acabei de voltar das férias e estava com o pique total? Ai sim me preocupei, pois alguma coisa eu teria que ter, aquilo não era normal! O Márcio não perdeu a oportunidade de brincar! “Não deve ser nada. Você viu o nome do médico no crachá?” Era o Dr. Inada. Depois que fiz os exames nos encontramos novamente com o Dr. Inada. Logo falei: “Não tem nada, né?” E ele olhou sério e disse que gostaria que não fosse nada, mas que infelizmente eu teria que ficar internada. Tinha um pneumotórax muito grande. Eu estava respirando mal porque o meu pulmão direito estava quase vazio. O ar tinha saído para o tórax. Com o tempo, esse ar que tinha escapado, poderia comprimir o outro pulmão que poderia furar também, além de empurrar os outros órgãos, como o coração, para fora do lugar, causando uma parada cardíaca. Ele já tinha comunicado o cirurgião torácico que estava de plantão para eu colocar um dreno e tirar o ar do tórax. Foi então que ele falou para nós esperarmos alí na recepção. Depois de falar mil vezes “Como assim vou ficar aqui?? Não posso. Tenho mil coisas pra fazer. foi quando eu me liguei que seria sedada e furada e comecei a chorar rsrs. O Dr. Inada nos chamou e nos encaminhou para a internação. Só faltava completar 8 horas em jejum. Logo o médico chegou para explicar qual seria o procedimento. Um médico bem mocinho. Foi muito esclarecedor, falou que eu teria que ficar 6 dias no hospital. Era estranho ter acontecido comigo, pois é uma ocorrência comum em homens altos e jovens de até no máximo 30, 33 anos. Bom, nem meu pulmão acompanha a minha idade cronológica. O que eu tinha eram bolhas no pulmão e uma tinha estourado. O pulmão esvaziou, como se fosse uma bexiga. O dreno tiraria o ar e o pulmão colaria novamente no tórax tampando o buraco. Em 98% dos casos o buraco cola na pleura do tórax e fecha. Em 50% dos casos há uma chance, de em até 6 meses, poder abrir um novo buraco e eu ter pneumotórax de novo. Que animador! Nesse caso costumam usar a laparoscopia e então cortar a parte de cima do pulmão onde estão as bolhas e colam a pleura (parede) do pulmão na pleura (parede) do tórax e assim o pulmão não esvazia mais. Cola? Sim, com um talco especial, ou grampeiam. Básico. O médico achou que o Márcio poderia me acompanhar ao centro cirúrgico e fiquei feliz. Anotei o que o Márcio precisaria trazer para o hospital e avisei que o Pedro teria uma festa na 6a. Precisava mandar o presente que estava comprado e pegar o endereço Às 16:45 daquele dia, tinha que pegar o Pedro na escola. O que ia dizer à ele? Pensamos e resolvemos juntos. Xi, 6 dias? Vou perder a Bienal do livro e já tínhamos feito uma divulgação dizendo que eu estaria lá. E o meu trabalho todo em andamento na escola. O consultório. O fórum das madrastas. Eu não acreditava que de uma hora para outra eu simplesmente tinha que parar tudo. Eram 16:30 quando fui para a sala de cirurgia. Veio um moço com a maca e uma camisolinha mega transparente. Tive que ficar sem roupa usando aquilo, mas, óbvio que não sai de lá enquanto não me enrolei também em um lençol. E coloquei aquele gorrinho horrível e fui toda saltitante, falando pelo caminho. Toda a minha alegria acabou quando na porta da sala de cirurgia falaram que o Márcio não poderia entrar. Como assim? Por que pra ter bebê pode? Que falta de humanidade! Fiquei arrasada e comecei a chorar. Não queria ir sozinha. Todos ficaram olhando pra mim, me explicando com toda a paciência do mundo porque não podia. Então EU entre lágrimas perguntei se não poderiam me dar a anestesia ali, antes de entrar e então descobriram a América rsrs Saiu um para cada lado, pegaram a minha veia e deram um Dormonide. Não vi mais nada. O Márcio foi para a escola buscar o Pedro (6 anos) e no carro explicou: “Lembra de manhã que a mamãe estava com aquela dor nas costas? Fomos ao médico e ele achou melhor a mamãe ficar no hospital pra tomar uns remédios. O ar do pulmão da mamãe saiu por um buraco e foi para o tórax. Para o ar sair de lá, o médico vai colocar um dreno que resolve o problema” “Pode morrer?”, ele perguntou. “Não filho, é tranquilo.”
Acordei depois que tudo estava feito. Eu ainda estava na sala de cirurgia e tinha um moço arrumando tudo. Devo ter feito pelo menos umas 15 perguntas pra ele. Não me lembro o que perguntei. Lembro que ele falou que ia me levar pra sala de pós operação. Lá tinha um monte de gente, uma maca ao lado da outra. Todo mundo coberto, de olho aberto, mas zen, olhando para o teto. Nossa que tédio. Tinham 2 enfermeiras que andavam pra lá e pra cá. Dessa sala eu me lembro de tudo! Uma delas cuidava dos paciêntes e eu estava com uma dor horrível debaixo do braço direito, mas só doia se eu me mexesse. “Está doendo”. Ela foi lá e falou que colocou Motrim no soro. Esperei o remédio fazer efeito, mas que nada! Vi o soro acabar. Falei que ainda estava doendo ela estava atendendo uma senhora que gemia e eu falei que esperava, pois ali algo muito pior estava doendo. “Posso telefonar?” “Estou com fome”. Gente, pensando agora, vejam que mala! Ninguém falava nada. Ninguém se mexia e eu avisava que tinha dor, que tinha fome e queria telefonar. O telefone estava ali em uma bancada. Eu queria ligar para o Márcio. Ele estava ali fora, já tinha chegado, pois tinha ido buscar o Pedro na escola, dado jantar, banho e deixado com a minha sogra e o meu enteado. A outra enfermeira andava pra lá e pra cá, usava um gorrinho personalizado escrito Samanta. Falava o tempo todo em um telefone sem fio. Nossa, eu queria aquele telefone. Ela reclamou alguma coisa assim: “Tô doando esse telefone que não pára de tocar”. Na hora falei que eu queria e ela falou que só ligava internamente, só no hospital. Será? Na próxima vez vou trazer o meu celular escondido aqui na minha camisola, falei. Naquele momento parecia que só eu estava viva. O resto do povo de olho aberto não emitia um som. Nem a senhora que antes gemia, emitia um som. “Fez efeito o remédio daquela sra, né gente?”A enfermeira estava no telefone explicando que o paciênte fulano de tal, que tinha feito implante peniano ia para o quarto número tal. Eu não acreditei! “Moça, coitado do moço, não conta isso, né? Finalmente ela deu um sorriso. “Estou com fome”. “Vamos levá-la lá fora, o seu marido está lá”. “Oba!” Mas foi a enfermeira erguer o encosto da cama e me levar pra fora pra eu passar mal. Finalmente quando vi o meu marido, veio aquele mal estar. Voltaram pra dentro e me deram glicose. Fazia muito tempo que eu estava sem comer. Como ainda ia demorar 40 minutos para eu ir para o quarto, pediram o meu lanche. Colocaram um biombo, comi deitada, pois não dava pra me mexer de dor debaixo do braço direito. Comi tudo! Yogurte de morango, queijo branco, sanduiche de queijo e presunto e torrada com geléia, depois com manteiga e a fruta. Assim que acabei avisei: “Acabei de comer, estava uma delicia, já vou para o quarto?” Eu não parava de falar, que chata! Seis e pouco foram me levar para o quarto e me despedi finalmente desse lugar entediante onde nem se pode usar o telefone rsrs. O Márcio já estava me esperando. Como não vagava um quarto normal, me mandaram para um especial, adoramos, era enorme! Chato era o barulho que vinha do corredor. Ao lado do quarto tinha o espurgo, uma sala onde ficavam as cadeiras de rodas, banquetas entre outros objetos que as enfermeiras pegavam a toda hora, sempre fazendo muito barulho. Por sinal hospital está longe de ser um local silencioso. Tem carrinho passando com a refeição o tempo todo. E o carrinho que vende revistas. Os enfermeiros entram e saem o tempo todo do quarto: “Trouxe o remédio! Paracetamol e e Pantozol” “Agora você tem o paracetamol” 5 da manhã: medir a temperatura e medir a pressão. Alguém tem idéia do barulho que faz aquele velcro do treco que tira pressão às 5 da manhã??? 3 dias depois, fomos despejados para um quarto normal rsrs Era menor, mas silencioso! Ficava bem longe do tal espurgo. Dormi a primeira noite inteirinha. Foram 6 dias conversando por telefone com a família e amigos. Explicar uma coisa tão sem explicação não era assim tão fácil. Pneumotórax espontâneo. Não fiz nada. Eu acordei assim. “Você precisa descansar” Eu gente? Acabei de voltar das férias, estou ótima! Inclusive agradeci muito a Deus por não ter acontecido enquanto eu estava viajando sozinha com o Pedro em outro país. Todos os dias as meninas da limpeza entravam no quarto sorridentes e muito educadas: ‘Posso higienizar?’ As fisioterapeutas e os moços do raio x e enfermeiros sempre perguntavam: “Qual é o esporte que você pratica?” Como eu estava totalmente fora do perfil de quem tem pneumotórax sempre achavam que eu tinha me machucado por praticar algum esporte radical. “Paraquedismo? Mergulho?” Não, eu não estava esquiando. A cada troca de plantão eu explicava tudo novamente. E foram umas 5 ou 6 fisioterapeutas diferentes. Foi um pneumotórax espontâneo. Sim, eu tenho 39 anos, não era pra acontecer. Não eu não fumo. Nunca fumei. Não cai de um avião.
Depois de três dias fazendo palavras cruzadas o Márcio trouxe o notebook. Foi nesse dia que coloquei o fórum das madrastas em dia e escrevi para os amigos contando as aventuras dos últimos dias.
O Pedro ficou seguro em casa com o irmão e estava todo orgulhoso por receber tanta atenção dele. Assistiam tv, jogavam DS e cantavam músicas juntos. “Pai, pode ir para o hospital”, ele dizia.
E lá chegava o Márcio com a sacolinha: coca-cola, Nutella, pão de forma, mais roupas. Eu só vesti uma peça de roupa muito importante: um top. Meu dreno no peito já tinha virado casa da mãe joana. Ao menos eu estava bem coberta. Nos últimos dias eu já ficava só de calça de agasalho e top, parecendo ainda mais ser uma esportista em recuperação.
Foi uma recuperação rápida. Quantas coisas eu aprendi. Mas pra que exatamente serviu esse evento? Será que foi para alertar à todos de que temos que dar bola imediatamente quando sentirmos um mal estar? Ou foi para o Lucas e o Pedro terem a oportunidade de conviverem mais? Foi para eu conhecer uma equipe médica tão bacana e competente? Foi para eu aprender mais sobre o corpo humano? Foi para eu dar valor por nada de errado ter acontecido na minha viagem sozinha com o Pedro? Ou foi para eu lutar pela cirurgia humanizada, ter um acompanhante dentro da sala de cirurgia? É muito chato ficar em um hospital. Eu queria ir embora e não podia. Eu pensei nas pessoas que estão nos presídios. Claro que merecem ficar lá, mas não é possível não ter uma depressão entre outros problemas emocionais. Não dá pra sair de lá melhor do que entraram.
Só sei de uma coisa: não quero mais ter que voltar para lá! Ah, e o médico recomendou: “Fale bastante!” rsrs
Beijos, Roberta